CULTO À CULTURA E VENERAÇÃO AOS AMORES

Quem não ama a cultura, não conhece a felicidade: não saboreia as magias da criação humana, não se aproxima de Deus ou de seja lá como o denominem, não se sente espremido pelo infinito universo de lendas e idéias e histórias e paixões e... não ri, não chora, entende cada vez menos das belezas da alma humana e é influenciado cada vez mais por suas atrocidades e limitações.

Quem não contempla o intangível, pára de sentir sede e, na secura dos bloqueados para o Amor, perde todos os amores. Encolhe-se, enruga-se, desnutrido do que estimula, do que diverte, do que sensibiliza, até mesmo do que enraivece. Porque quem não cultua o que o homem é capaz de produzir não pode senão converter-se em menos humano.

Alma penada em corpo de gente caminha em vultos, amedronta, mas não sente medo; gera curiosidade, mas por nada se interessa; provoca risos e balbúrdias, mas não se sabe mais na gostosura dos sorrisos.

Quem vive das mediocridades adultas, acordando para esfriar-se e esfriando-se para dormir, descobre-se um dia na gélida ponte que parte do nada para lugar algum. Entende o que perdeu, o que ocorre, o que falta, mas, na sua descrença treinada e paralisante, não cria nem leituras, nem soluções. E ali se estagna, na angústia de uma ponte imóvel...

Enquanto isso, outros andam, transitam, descobrem, deliciam-se. Enquanto isso, o mundo gira.

Como pode uma amizade crescer se não por deleites do que é simples?
Quem pode manter o convívio se não surpreende e se encanta?
Como podem dois suportarem-se para sempre se não descobrem-se um ao outro, mas também fora deles, contando as descobertas e construindo pontes que libertam para o infindo?

Construir, decorar, esculpir, cozinhar, comer, cantar, dançar, vestir, pintar, sentir e expressar-se, assistir e perceber as mãos em brasas pela aprovação sonora e universal, inventar, contemplar, ler, escrever, ouvir, tocar, descobrir mais e mais, perceber que mais é sempre pouco... e andar! Para frente, para trás livre e conscientemente, para o lado experimentalmente, em torno do próprio eixo subversiva ou deliberadamente. Correr ou parar!

A criança que brinca e regozija-se em ternuras, cores e sons prevê como se deve viver. Mas quem não pulsa com a cultura ou dela desistiu, já não pode mais amar de verdade. Admira alguém, mas se acha indigno do que de belo nela existe.

A cultura reinventa-se, cria novos rumos para a história da humanidade, de qualquer canto e de cada pessoa. Portanto, quem ama o que de dentro da gente sai, não se contenta! Existe na busca incansável por registrar a história que nasceu para viver, ainda que entre sofrimentos e suores.

Mas quem a ela não cultua, morre antes mesmo de morrer.

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