NO DIA EM QUE CHOVERAM AS ÁGUAS E AS IDÉIAS - E VOLTOU A VONTADE DE ESCREVER

Trajeto triplicado, mais de três horas de imobilidade tripla dentro de um ônibus que nada. Ansiedade para não atrasar no segundo dia de trabalho,e esforço para memorizar as faces de todas as criaturas dos veículos ao lado, identificar todas as figuras e se comunicar com muitos deles, crianças!

Até que aquele jogo perdeu a graça. Não queria mais brincar! Dor na cabeça e no traseiro, livro retomado por inúmeras vezes, descartado, celular sem bateria, rio amarronzado em plena orla marítima. Fechem as portas do céu!

E minha fase sensível tinha que vir à tona, afinal de contas, quando não se tem exatamente com o quê se ocupar, a mente começa a vagar por subjeções nem sempre desejadas...

Ultimamente sumi. Muita coisa mudou e conseqüentemente foram se organizando "aqui dentro". Após divagações sobre o significado dessa tal serenidade que bateu à porta, descobertas acadêmicas empolgantes, novo emprego e terrorismo, esse blog ficou em último plano...

Debaixo da tempestade de canivete, eis que me vem à memória o mesmo menino, pés no chão, shorts rotineiros, rasgados e sujos, sorriso largo, meiguice no olhar... O mesmo moleque que encontro todos os sábados, o mesmo que almoçou comigo à mesa do restaurante com olhares reprovativos esfriando a comida alheia. Será que mora numa daquelas muitas casas que hão de deslizar? Será que passa um frio tão cruel quanto aquele do restaurante? Será que tem cobertor? Desliguem essa merda desse ar-condicionado! Chove lá fora e a gente aqui, usando essa joça! Chove lá fora...

Pensamentos inflamados na faculdade que aumentou a mensalidade em 16%; no país que perdeu 198 pessoas; no acampamento que fechou as portas da Federal. Pensamentos ardentes no show da Concha Acústica; na roda de capoeira; na aula de Pesquisa. Pensamentos inflamados ao escrever poesia, ao relatar esses fatos, ao cantar uma canção. Pensamentos inflamados pelas favelas da cidade, onde foram parar então?

Sensibilidade à flor da pele, na alma, na ponta dos dedos e dos neurônios, no pulso que "ainda pulsa". Paz de espírito comprometida. Revolução se faz assim? Digo com fogo nessas veias: "enquanto a chama arder", quero a inflamável possibilidade de sacralizar tudo que move. E não é preciso residir aqui ou ali para entender esse "desespero" aí...

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